En castellano:
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Em português:
O NOSSO NOME ORIGINAL
"Hispânia" prove do fenicio i-span-ya (fenicio <איספני>), um termo latinizado pelos romanos e cujo uso está documentado desde o segundo milénio dantes de Cristo, em inscrições ugaríticas. (1)
O significado da palavra Hispânia é “ilha onde se batem metais”. A “i” tanto em hebreu como em fenicio, significaria “ilha” ou “costa”; “Span” da raiz
spy significaria “revestir de placas de metal”. A terminação “ya” explicar-se-ia como terminação de nome de ofício, documentado em ugarítico. (2)
Os fenicios foram os primeiros em batizar-nos e constituíram a primeira civilização não ibéria que chegou à península para expandir o seu comércio e que fundou cidades como Cádis, Málaga ou Ibiza, entre outras.
ROMA
Com Roma Espanha atinge a sua primeira fórmula de unidade, cultural e histórica, e política, como província do Império.
A dominación romana em Hispânia durou mais de seis séculos; embora na zona cántabra foi de dois séculos menos, toda Hispânia ficou profundamente romanizada; a língua, a cultura, as leis, os costumes, a religião de Roma impuseram-se tão profundamente, que as suas impressões ainda perduran. (3)
O termo
Hispânia além de aludir a um determinado território, isto é, à península e as suas terras adjacentes (Ilhas Baleares), fazia referência aos seus habitantes, bem como também se mencionava com essa expressão a uma série de costumes, mais ou menos similares, que desenvolviam os pobladores dessas terras, aos que se chamava com o sugestivo termo de
hispani. (4)
Como nos explica Luis Suárez Fernández os
hispani “seguiam sendo considerados como uma comunidade bem definida dentro do variado conjunto mediterrâneo”. (5)
CAÍDA DE ROMA, ESPANHA COMO REINO INDEPENDENTE
Com a queda de Roma Espanha passa a ser um Estado independente, um Reino, o Reino visigodo espanhol.
No ano 475, Eurico recebe uma espécie de investidura romana para o conjunto de Hispânia, de mãos do penúltimo imperador de Roma, convertendo-se no primeiro rei de Espanha. (6) Espanha, por tanto, adquire a primeira fórmula da sua unidade histórica de forma independente (depois da unidade romana) de mãos de uma Roma agonizante.
Os visigodos, a diferença dos francos, os germanos, os anglos, os saxões, os borgonheses e os lombardos, nunca substituíram o nome latino do seu território por um próprio, chamando ao seu reino Hispânia. Nas postimarías do período visigodo o termo
Hispânia se abreviava em ocasiões até converter-se em
Spania e os seus reis eram às vezes denominados “reges Spaniae”. (7)
Os godos assimilam a língua, a cultura, os costumes e a religião dos hispanos e, baixo as ruínas da Hispânia romana, fundam a Hispânia goda.
A ESPANHA VISIGODA
O Reino visigodo espanhol passou por várias fases onde atingiu a unidade cultural, religiosa, territorial e jurídico-política que converteram ao Reino visigodo em uma nação.
Unidade cultural: os visigodos, apesar de ser um dos povos bárbaros mais romanizados, encontraram em Hispânia uma sociedade totalmente romanizada (na sua imensa maioria) o que fez com que adotassem a cultura e tradições dos hispanos, incluída a língua latina.
E como grande representante da cultura espanhola do Reino visigodo temos a Santo Isidoro de Sevilha, que foi o grande polígrafo ocidental da sua época e realmente o erudito espanhol mais influente de todos os tempos. Santo Isidoro referia-se ao Reino visigodo denominando-o
“Pátria” de “os povos de toda Espanha”. (8)
Para o historiador Jacques Fontaine isto constituiu “a gênesis da ideologia hispano-gótica”, gerando “uma espécie de
nacionalismo cultural”. (9)
Este nacionalismo cultural podemo-lo encontrar nas Etimologías de Santo Isidoro de Sevilha, escritas em plena maturidade, entre o 627 e o 630, nas que podemos encontrar a sua "De Laude Spaniae", ferviente demonstração do seu
sentimento nacional por Espanha:
"De todas as terras, quantas há desde Occidente até a Índia, tu és a mais formosa, oh sacra Espanha, mãe sempre feliz de príncipes e de povos! Bem se te pode chamar rainha de todas as províncias....; a tua honra e ornamento do mundo, a mais ilustre porção da terra, em quem a gloriosa fecundidade da raça goda recrear-se e floresce. Natura mostrou-se pródiga em enriquecer-te; tu, exuberante em frutas, enchida de videiras, alegre em messes..., tu abundas de tudo, assentada deliciosamente nos climas do mundo, nem torrada pelos ardores do sol, nem arrefecida por glacial inclemência... Tu vences ao Alfeu em cavalos, e ao Clitunno em gados; não invejas os soutos e os pastos de Etruria, nem os bosques de Arcádia...
Rica também em filhos, produzes os príncipes imperantes, ao mesmo tempo que o púrpura e as pedras preciosas para os enfeitar. Com razão cobiçou-te Roma, cabeça das gentes, e embora te desposo a vencedora fortaleza Romulea, depois o florescessem povo godo, depois de vitoriosas peregrinações por outras partes da órbita, a ti amou, a ti raptou, e te goza agora com segura felicidade, entre a pompa régia e o fausto do Império".
Para Menéndez Pidal este louvor a Espanha “é o canto auroral da calhandra que acompanha aos desposórios de Espanha com o povo godo e
anuncia a chegada da nova nação”. (10)
Santo Isidoro escreveu isto muitos séculos antes de que existissem Castela, Aragão, Catalunha, Valência, Portugal...
Espanha era, em pleno século VII, a Pátria, a Nação, dos hispanos.
Unidade religiosa: o 8 de maio de 589 no III Concilio de Toledo Recaredo ratifica a sua conversão ao catolicismo. Para o professor Teodoro González esta conversão “é o ato fundamental do reinado de Recaredo, e para mim, o mais importante de toda a história de Espanha pelos seus envolvimentos políticos e religiosas. Punham-se com ele os alicerces de uma nova
nacionalidade espanhola, ao conseguir a unidade religiosa e política do povo invasor e dos habitantes hispano-romanos da Espanha visigoda. Então
adquirem todos os habitantes de Espanha a convicção de que formam um povo, uma nação, se eliminando, ademais, os obstáculos que pudessem existir para chegar à fusão de raças”. (11)
Os visigodos presidiram uma cultura religiosa enormemente desenvolvida para a época e começaram a formar um tipo especial de ideologia e de identidade regia, de maneira que em verdadeiro momento do século VII a monarquia visigoda representava um modelo político e religioso tão desenvolvido como outros que se podiam encontrar em Occidente. (12)
Unidade territorial: os visigodos lutam por expulsar do seu reino aos demais povos assentados nele e recuperar assim a unidade territorial romana.
Leovigildo no ano 585 vence definitivamente aos suevos, convertendo-se no grande restaurador da
unidade de Espanha.
Unidade que consumou o rei visigodo Suíntila no 624 ao expulsar definitivamente aos bizantinos.
O Reino visigodo espanhol era um território definido com precisão, em realidade, o primeiro Estado cristão e europeu em contar com uma exata definição geográfica. Nenhum dos seus contemporâneos a teve, nem doutrinal nem territorial. (13)
Unidade jurídico-política: a unidade católica, rubricada com a unidade territorial, atingia a sua zénite com a unidade jurídica quando no 654 Recesvinto promulgó o “Liber Iudiciorum” ou “Fuero Juzgo” (nome com o que foi traduzido em tempos de Fernando III de Castela).
O código compreendia doze volumes que tratavam de forma sistémica as aspectos legislativas do Reino. A partir desse momento tanto godos como hispanos reger-se-iam pelas mesmas leis.
Por fim a população hispana e goda via culminar o processo da
unificação populacional. (14)
A primeira pedra, dessa unidade populacional, pô-la Leovigildo com a sua “Codex Revisus”, em 573, suprimindo a odiada lei que proibia os casamentos mistos, entre hispanos e godos, feito com que produziu a unidade étnica dos dois povos que fez desaparecer as palavras “gothi” e “romani”, substituídas agora por “hispani”. (15)
O IV concilio de Toledo, celebrado em dezembro de 633, aludia ao conjunto da população, considerando-a parte de uma única “gens et pátria” (povo e pátria). (16)
O “Fuero Juzgo” foi o código jurídico mais extenso da sua época, relativamente o mais complexo, e durante uns seis séculos foi seguido de diversas maneiras em todos os estados hispânicos, sem exceção. (17)
Como vimos o mito de que Espanha nasce com os Reis Católicos é completamente banido.
Um cronista da época, Mosén Diego de Valera, dirigiu-se a Fernando o Católico indicando-lhe o seguinte:
“es profetizado de muchos siglos acá que no solamente seréis señor de estos reinos de Castilla y Aragón, que por todo derecho vos pertenecen, más avréis la monarchía de todas las Españas e rreformaréis la silla ymperial de la ínclita sangre de los godos donde venís”. (18)
Claro exemplo de que o novo Estado criado com a união de Castila e Aragão era a recuperação, ainda inacabada (faltavam Navarra, Granada e Portugal), do antigo Estado visigodo.
A PERDA DE ESPANHA
O 19 de julho do ano 711, nas margens do Guadalete, as tropas árabes e bereberes de Tárique derrotam completamente ao exército visigodo do rei Rodrigo, vítima da traição dos filhos de Vitiza e os seus allegados.
Houve uma segunda batalha em Écija, onde já não se repetiu a traição do Guadalete e os invasores sofreram uma grande mortandad, mas ganharam a batalha.
Tárique avançou como uma seta até a capital do Reino, Toledo, onde defraudo aos vitizanos, que esperavam a entronização de um dos seus. Tárique, que conquistou Toledo com a eficaz cooperação dos judeus, desprezou aos traidores e assumiu o Reino de Espanha em nome do califa de Damasco. Era o dia de San Martín, 11 de novembro de 711, data que marca a
perda de Espanha. (19)
Na
Crônica Moçárabe do ano 754 podemos ler como “Rodrigo
perdeu miseravelmente, além do seu poder, a sua
pátria”. (20)
RECONQUISTA
Com a Reconquista pretendia-se recuperar a “Espanha perdida” (21), o Reino visigodo espanhol, por isso os primeiros reis hispanos são nobres visigodos, que baseiam a sua legitimidade nessa ascendência. (22)
Inclusive entre os moçárabes (cristãos em território muçulmano) sentia-se falta aquela “Espanha perdida” no trágico ano 711, como comprovámos na citada
Crônica Moçárabe.
A ideia da reunificação hispânica esteve sempre latente durante toda a Reconquista, e todos os reinos cristãos tinham esse objetivo, como se demonstra nos textos históricos. (22)
Os francos diferenciavam os territórios de Espanha do resto das suas haveres e davam à parte cristã de Espanha, que deles dependia, umas leis próprias e diferentes ao resto de territórios. A Espanha consideravam-na uma
unidade política e jurídica diferente a qualquer dos seus outros territórios. Carlos Magno e os seus imediatos sucessores criaram um regime especial, de privilégio, o chamado
“regime dos hispanos”. (23)
O território hispano conquistado aos árabes pelos francos foi chamado com o significativo nome de Marca Hispânica (origem de Catalunha).
O CONCEITO DE ESPANHA
Todas as variantes do termo
Hispânia, tanto latinas (Spaniae, Spania…) como em língua romance (España, Espanya, Espanha…) significam o mesmo e fazem alusão a toda a nossa península (e as suas terras adjacentes, as Ilhas Baleares).
O conceito do termo
Espanha começa a desvirtuar com a união das coroas de Castela e Aragão.
Com a unidade das duas Coroas muitos, desde o estrangeiro (24), começam a chamar “reis de Espanha” aos Reis Católicos, título que recusam por não ser reis de Navarra e Portugal.
“... Isabel e Fernando (os Reis Católicos), quem recusam a titulação de “reis de Espanha” proposta pelo Conselho Real uma vez reunida a maior parte da península, porque sem Navarra e Portugal estava incompleta”. (25)
Mas muitos já lhes chamam reis de Espanha, com as conseguintes
protestos dos reis portugueses, (26) e assim chamarão aos seus sucessores. A mudança de dinastia (a uma dinastia estrangeira, os Áustrias) e o giro dos interesses políticos para o Império farão o resto.
Até o século XVIII
os mesmos portugueses denominam-se a eles mesmos espanhóis. Assim chama aos portugueses o também português Luis de Camões, o poeta mais importante da história em língua portuguesa, que os define como:
"Uma gente fortíssima de Espanha". (27)
Para mais informação:
http://portugalhispanico.blogspot.com/
Esta identificação do termo
Espanha com a união de Castela e Aragão (e mais tarde Navarra) fará com que os portugueses, para se diferenciar do outro Estado peninsular, parar de chamar espanhóis, e com isso perdem grande parte da sua identidade, e o termo
Espanha fique, irremediavelmente (ou quiçá não…), desvirtuado.
NOTAS:
(1) Mª Cruz Fernández Castro: “La península ibérica en época prerromana”, no capítulo “Los inmigrantes fenicios”, página 40.
(2) Jesús Luis Cunchillos: “Nueva etimología de la palabra Hispania”, Actas del IV Congreso Internacional de Estudios Fenicios y Púnicos, Vol. I, Cádiz 2000, páginas 217-225.
(3) Marcelo Capdeferro: “Otra historia de Cataluña”, página 20.
(4) Julio Valdeón Baruque: “La Reconquista”, página 24.
(5) Luis Suárez Fernández: “Hispania: los fundamentos de la Nación española”, na Real Academia de la Historia, España como nación, página 21.
(6) Ricardo de la Cierva: “Historia total de España”, páginas 125 e 126.
(7) Stanley G. Payne: “España, una historia única”, página 81.
(8) Jacques Fontaine: “Isidoro de Sevilla”, página 284.
(9) Jacques Fontaine: “Culture et spiritualité en Espagne du IV au VII siècle”, página 38.
(10) Ramón Menéndez Pidal: “España y su historia”, Vol. I, página 213.
(11) Ricardo García Villoslada, Manuel Sotomayor, Teodoro González García, Pablo López de Osaba: “Historia de la Iglesia en España: La Iglesia en la España romana y visigoda siglos I-VIII”.
(12) Stanley G. Payne: “España, una historia única”, página 82.
(13) Stanley G. Payne: “España, una historia única”, página 81.
(14) Juan Antonio Cebrián: “La aventura de los godos”, página 187.
(15) Vicente Ángel Álvarez Palenzuela (Coord.): “Historia de España de la Edad Media”, página 49.
(16) Gonzalo Martínez Díez y Félix Rodríguez Barbero: “La Colección Canónica Hispana”, Vol. V, páginas 248-253.
(17) Stanley G. Payne: “España, una historia única”, página 79.
(18) Julio Valdeón Baruque: “La Reconquista”, página 174.
(19) Ricardo de la Cierva: “Historia total de España”, páginas 150 e 151.
(20) John V. Tolan: “Sarracenos”, página 111.
(21) Jesús Laínz: “Adiós, España”, página 82:
O lamento pela Espanha perdida em Guadalete, já encontrável na Crônica Moçárabe do ano 754, foi compartilhado por todos os peninsulares, de uma ponta à outra. O navarro Rodrigo Jiménez de Rada (1170-1247) escreveu: “Ai dor! (…) este reino tão notável, tão distinto, blandida contra si mesmo a própria espada (…) se derrubou nos prolegómenos de um só ataque. E foram conquistadas todas as cidades de Espanha”.
(22) Luis Íñigo Fernández: “España: historia de una nación inacabada”, página 134:
Os textos pioneiros daquela rudimentar historiografia medieval, que datam de fins do século IX, a “Crônica Albeldense” e a “Crônica de Alfonso III”, legitimam já aos primeiros reis sobre a base da continuidade dinástica com respeito aos seus predecessores godos; descrevem a derrota de dom Rodrigo em Guadalete como a “perda de Espanha” e definem com clareza meridiana o seu programa político: a “Hispaniae salus”, “a salvação de Espanha”.
(23) Ferran Soldevila: “Història de Catalunya”, página 37.
(24) Julio Valdeón Baruque: “La Reconquista”, página 177:
Muito significativo foi o que disse o conhecido humanista italiano Pedro Mártir de Anglería, quem terminou assentando-se em terras hispanas: “Reis de Espanha chamamos a Fernando e Isabel porque possuem o corpo de Espanha; e não obsta, para que não os chamemos assim, o que falta deste corpo dois deditos, como são Navarra e Portugal”.
(25) Fernando García de Cortázar y José Manuel González Vesga: "Breve Historia de España", página 29.
(26) Stanley G. Payne: “España, una historia única”, página 166:
“Fernando (o Católico), por exemplo, falou da Coroa de Espanha durante um ato público em 1514. Nessas raras ocasiões a Coroa de Portugal nunca demorava em apresentar as suas queixas, porque a ideia de que o termo Espanha aludia a toda a Península seguia estando muito arraigada, e assim manter-se-ia até bem entrado no século XVIII”. (…) “Até onde eu sê, a última grande ocasião na que a Coroa portuguesa questionou a utilização das expressões Coroa de Espanha ou Monarquia de Espanha para aludir aos governantes de Madrid foi na época da Paz de Utrecht de 1714”.
(27) Luís de Camões: “Os Lusíada”, (1572) Canto I, estrofa XXXI.